Texto: Guilherme Alferes
Fotos: Acervo
Estima-se que 1,4 milhão de pessoas necessitaram de reassentamento em 2018 e apenas 92.400 tiveram a oportunidade de conquistar um novo lar. O dado é do Relatório de Tendências Globais do Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR). Um destes exemplos de recomeço em um novo país é do africano, Abdoulaye Guibila, oriundo de um pequeno país, chamado Burkina-Faso.
Guibila tem 29 anos e está em solo brasileiro desde 2014. O burquinense conta que saiu de sua terra por conta das dificuldades financeiras e políticas que o país enfrentava. Ele participou de protestos contra o governo, que define como ditatorial, e relembra a dura repressão que sofreu durante o período.
Quando um amigo, que o ajudou a sair do país, lhe sugeriu o Brasil, a ideia não foi aceita rapidamente porque não falava português e nunca havia tido contato com a cultura brasileira até então. No entanto, a vontade de ir em busca de um lugar que lhe proporcionasse melhores condições de vida superou o medo.
Ao chegar em São Paulo, parado na frente de um hotel onde passou três dias hospedado, viu um senegalês, vendedor de relógios, e foi conversar com ele. Descobriu, então, a existência do Centro de Acolhida Arsenal da Esperança, lugar que se tornou um lar e transformou sua história.
O Arsenal da Esperança é um serviço de acolhimento conveniado com a Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social (SMADS) no qual pessoas em situação de rua, e também imigrantes, são acolhidos. Os estrangeiros participam de diversas atividades socioeducativas, incluindo curso de português, que visam preparar e criar condições para que esta população conquiste autonomia. Uma das responsáveis por ensiná-los a língua portuguesa, por exemplo, é a professora Sônia Altomar, com quem Guibila criou um vínculo de amizade.
A professora sugeriu ao jovem, que trabalhava como auxiliar no ramo da construção civil, um curso de gastronomia com duração de três meses. Profissão pela qual Guibila acabou se apaixonando e que segue até hoje. “Eu não me imagino fazendo outra coisa”, revela. Desde 2016, ele trabalha em duas filiais de uma pizzaria, uma no bairro Tatuapé e outra na região da Avenida Paulista, além de dar aulas particulares de francês. Com dedicação e empenho, a autonomia foi sendo conquistada aos poucos e atualmente mora sozinho em uma casa alugada, na Vila Progresso, zona leste de São Paulo.
Sentindo-se acolhido em terras brasileiras, o sonho do imigrante é trazer a mãe, que ainda se encontra no país natal. Guibila têm cinco irmãos e seu pai faleceu em 1992.
Ao lembrar das desafios que enfrentou quando chegou, o ex-convivente menciona a adaptação com a alimentação. “A coisa que eu mais estranhei foi que o brasileiro come muito arroz e feijão”, comenta.
Abdoulaye Guibila conta que tinha dificuldade para falar que não come carne de porco, por exemplo, e que, em sua terra natal, costumava comer um prato chamado Fufu, que ele define como “uma espécie de polenta”. Outra diferença alimentar que o incomodava é que os brasileiros costumam comer menos de manhã que os burquinenses.
Porém, as diferenças culturais também foram positivas. “Aqui há a cultura de as pessoas se abraçarem, não é em todo lugar que é assim, e eu acho importante fazer isso, manifestar a vontade de afeto com o outro”, revela.
A amizade com a professora que tanto o ajudou continua forte e Guibila comenta que ela é sua “mãe brasileira”. Os planos do imigrante são de firmar raízes, e no futuro, deseja fazer faculdade de Gastronomia para abrir uma confeitaria. “O que eu mais gosto de fazer são doces”, relata.