Paulistano assume a Virada Cultural em clima de paz

O evento, que aconteceu neste fim de semana, envolveu milhares de paulistanos e garantiu a sua repetição em 2006.

Em 24 horas muita coisa pode acontecer. E acontecer com emoção, diversão, alegria e tranqüilidade. Assim é o balanço geral da primeira Virada Cultural da cidade de São Paulo. O evento, que aconteceu neste fim de semana, envolveu milhares de paulistanos e garantiu a sua repetição em 2006.

“É a democratização da cultura. O potencial dessa cidade é infinito. O que nós fizemos foi só estimular as pessoas”, disse o prefeito de São Paulo. Segundo ele, as próximas edições devem acontecer em maio, um mês sem chuvas. “Precisamos fazer um acordo com São Pedro”, brincou.

Cerca de dez mil pessoas, principalmente crianças, acompanharam o show de encerramento de Adriana Calcanhotto, no Museu do Ipiranga. Para a realização do evento no parque, a prefeitura contou com a ajuda da diretora do Museu do Ipiranga, Eni de Mesquita Samara, que se envolveu com tudo e contribuiu para que, pela primeira vez, o local funcionasse durante 24 horas. “Não é à toa que este museu continua batendo recordes de o mais visitado da América Latina”.

Tranquilidade

A Central de Operações da Polícia Militar (190) não registrou qualquer ocorrência nos mais de 100 eventos da Virada Cultural. As 25 viaturas de socorro médico, incluindo ambulâncias U.T.I que ficaram de plantão em cada um dos locais de grande afluxo de público, também não fizeram atendimentos de emergência.

Para a Virada Cultural, a PM colocou nas ruas um efetivo de 972 homens e 413 viaturas. A Guarda Civil Metropolitana (GCM) mobilizou um contingente de 1.013 homens e 113 viaturas. Há também 47 bombeiros de plantão nos principais palcos do evento.

A tranqüilidade do evento foi ressaltada pelo presidente da São Paulo Turismo, que costuma dizer que “São Paulo é a nossa praia”. Ele se emocionou em suas visitas às atrações de diversas regiões ao perceber que as pessoas andavam descontraídas pela rua, em um clima bem alegre. “São Paulo abraçou a cultura, o maior valor econômico desta cidade.”

Novidades não faltaram para ampliar esse abraço. Exatamente às 3h30 da manhã, os paulistanos ganharam um novo projeto cultural. O “Teatro de Livro”, experiência piloto encenada no palco do Mercado Mundo Mix, na Praça Roosevelt, a partir da leitura performática do livro “O Mistério das Bolas de Gude”, de Gilberto Dimenstein, agora será permanente.

A praça, revitalizada, vai abrigar leituras dramatizadas de obras inéditas, com a participação dos próprios escritores e grupos teatrais.

Pirotecnia

Um espetáculo pirotécnico simultâneo, de quatro minutos, enfeitou o céu da cidade à meia-noite, marcando a passagem do dia 19 para o dia 20 de novembro da 1ª Virada Cultural de São Paulo. Os fogos cobriram as mais de cinco mil pessoas que assistiam ao Cisne Negro com os bailarinos da Cia de Dança no palco montado no Museu do Ipiranga. O bom tempo animou o público, que levou banquinhos e cadeiras de praia para o jardim do Parque da Independência para curtir a programação à luz do luar.

A chuva chegou, mas o ânimo do paulistano não arrefeceu. O público que acompanhava o Ballet Stagium, dançando músicas de Chico Buarque no palco do Ipiranga, ignorou a forte chuva e continuou assistindo ao espetáculo, abrigados sob sombrinhas e guarda-chuvas e na entrada do museu.

Cerca de duas mil pessoas nos espaços do teatro, lanchonete e rua central deixaram a madrugada do Sesc Pompéia com cara de dia. Pessoas fazendo arte nas paredes. Cinema ao ar livre. Famílias inteiras, crianças, jovens, turmas da terceira idade.

Essa vontade de participar foi observada durante todo o evento pelo secretário municipal de Cultura: “Nosso objetivo era oferecer de tudo para todos, e acho que conseguimos um ótimo resultado. O melhor é perceber que as pessoas puderam encontrar algo de si nessa programação, descobrir o que gostam. A Virada veio para ficar”.

Em Parelheiros, por exemplo, o que seria um show na Praça Central foi ampliado com apresentações de grupos locais que se integraram à programação com shows de samba, rock, MPB e outros ritmos nos bairros Embura, Colônia, Vargem Grande, Praça do Trabalho, Nova América e Jardim Herplim. No Largo Piraporinha, em M´ Boi Mirim, grupos locais se incorporaram à programação e animaram a festa. Cerca de mil pessoas acompanham os shows.

O secretário adjunto de Cultura considerou um momento especial para São Paulo a redescoberta de São Paulo. Na Casa das Rosas, na Avenida Paulista, por exemplo, cerca de 300 pessoas lotaram todos os espaços nas apresentações de poesia, música e teatro durante a madrugada e ainda ficaram para o café da manhã. “As pessoas retomaram o caminho que tinha sido perdido. Estamos recuperando a dignidade e o prazer de se viver nesta cidade”, analisou.

Os artistas também se envolveram com emoção e entusiasmo na Virada Cultural. A cantora Elza Soares não media palavras momentos antes de se apresentar no Vale Anhangabaú: “É bem melhor dar ao povo a oportunidade de virar a noite embalado por boa música do que assistir às CPI´s”.

Paulo Vanzolini, que fez um dos mais belos shows da Virada, com participação especial da cantora Vânia Bastos, não conteve a emoção ao ouvir o público de mais de 800 pessoas cantar a música que o eternizou na música popular brasileira. “Foi a maior emoção da minha vida cantar Ronda no Vale do Anhangabaú ao lado”.

O cinema teve vez no Cine Olido, no Cinesesc, no MIS, na Cinemateca Brasileira, no Centro Cultural Banco do Brasil, na Aliança Francesa e em vários espaços da cidade. A pré-estréia do filme Bens Confiscados, dirigido por Carlos Reichenbach, lotou a sala de exibições do Museu de Imagem e do Som, na Avenida Europa.

O dia amanheceu com o maestro João Carlos Martins a postos para reger a Orquestra Bachiana para o público que emendou a noite no palco do Museu do Ipiraga. Para ele, que já participou de vários eventos como esse, as famosas Noites Brancas em outros locais do mundo, a Virada Cultural coloca São Paulo como um grande centro gerador de cultura: “É o master series da Cultura. São Paulo está de parabéns pela inovação, pela vanguarda”.

De Norte a Sul. De Leste a Oeste. A cidade não parou um minuto. Cerca de 25 mil pessoas lotaram o estacionamento do Sambódromo no maior festival de música gospel do Brasil; o público foi sambar nas ruas em frente à Galeria Olido; um trio elétrico agitou a Rua Augusta; o teatro de rua invadiu a Capela do Socorro; a animação do reggae de São Miguel Paulista; e lotação no Museu da Casa Brasileira.

Fatos pitorescos não faltaram no evento. Um acontecimento inusitado na Praça da Sé fez as bandas de rock silenciaram as guitarras por alguns minutos. Em respeito ao casamento dos advogados Flávia Drittes e Ricardo Freitas, marcado para às 19h na Catedral da Sé, as bandas que participavam da Virada Cultural interromperam o show para o início da marcha nupcial. Ao fim da cerimônia, o show continuou.

Para os jovens, não faltaram atividades. O Mercado Mundo Mix, criado em São Paulo e que estava longe da cidade há dois, depois de percorrer outras capitais e fazer sucesso em Portugal, voltou com tudo para a Virada Cultural, instalado na Praça Roosevelt.

Na edição montada especialmente para o evento não está sendo cobrado ingresso, mas o visitante tem de levar um brinquedo em bom estado. Até às 23 horas já tinham sido arrecadados cinco mil brinquedos, que serão doados para o natal da cidade de São Paulo, patrocinado pela Casa da Solidariedade da Prefeitura.