Qual é o teu maior adversário hoje a nível mundial?

TIAGO CAMILO: Hoje? Eu acho que todos os atletas são competitivos hoje, o judô se encontra num nível muito alto, tem que encarar todo mundo como o maior adversário. Mas eu costumo dizer que o maior adversário pra mim é o treinamento.

Por que?

TIAGO CAMILO: O treinamento é o meu maior adversário, você lidar com o dia a dia, com a motivação, com o cansaço, com as lesões... não é um dia de treino, nem um mês, nem um ano; são vários anos com a mesma intensidade, todo dia, dois períodos, cinco horas por dia... o treinamento é o adversário incansável.

Cansa demais mesmo? Como você agüenta?

TIAGO CAMILO: É cansativo, mas eu sei que do outro lado tem um alvo grande me esperando, então eu sempre sigo à frente, porque eu sei que a glória virá.

Como assim, a glória virá? A glória já veio, você é o maior judoca do Brasil no momento...

TIAGO CAMILO: Em termos de glória eu falo de cada competição. Cada competição você tem um objetivo. E a cada ano você tem grandes objetivos. Meu grande objetivo agora é ser campeão olímpico em 2012. Para eu chegar lá, tem várias metas a serem cumpridas. Essas metas têm várias competições. Então, cada resultado não deixa de ser uma glória. Eu acredito que tudo isso é construído de uma maneira muito intensa.

A partir de que momento o judô brasileiro se tornou grande como é hoje?

TIAGO CAMILO: Eu acho que depois de 2005, com a conquista do título mundial de João Derly muita coisa se abriu. Em 2007 a gente teve três campeões mundiais. Em 2008 a primeira mulher a ser medalhista olímpica. De 2005 pra cá... o Brasil abriu a porta e muitas coisas aconteceram.

Você acha que o judô é uma grande porta para a inclusão social?

TIAGO CAMILO: Eu acredito. Na verdade, o judô foi criado pra isso. A filosofia do judô é mais do que a competição. Na verdade, a competição é a deturpação do judô. Existe um lado de disciplina, de filosofia do esporte, que deve ser usado de uma maneira muito melhor. Além de formar o judoca, o judô forma um cidadão. O meu esporte é uma ferramenta muito forte. Se você usa essa ferramenta você tira as crianças da rua e dá oportunidade para elas sonharem.

Você acha que através do judô é possível tirar as crianças da rua? O judô tem esse potencial?

TIAGO CAMILO: Tem, porque há exemplos concretos, vários projetos consolidados no Brasil mostram que o judô é realmente uma ferramenta de transformação.

Os viciados em crack poderiam ser transformados pelo judô?

TIAGO CAMILO: Sem dúvida. O judô não é um esporte difícil. Tem que ter uma área, um tatame e um quimono. Não é um esporte caro. É muito viável. E além disso tem uma disciplina como nenhum outro esporte tem.

O que você aprendeu com o judô?

TIAGO CAMILO: Na verdade, o judô é uma escola pra vida, que ensina a gente a ser homem. O primeiro ensinamento do judô é saber cair. Você cai e se levanta, como na vida. A gente tem vários problemas, várias dificuldades, você vai ter que levantar e continuar andando. O verdadeiro campeão não é aquele que ganha sempre, é aquele que perde, levanta e continua a caminhada. E depois vêm outras coisas, como respeitar os mais velhos. Eu, na minha infância tinha que levar mensalmente um questionário pra minha casa que meus pais respondiam. Nesse questionário constava como eu era em casa, se eu respeitava meus pais, se eu falava bom dia, boa tarde, boa noite, por favor, obrigado, como era na escola. Então, se eu tivesse bons momentos eu poderia participar do judô. Se não, não. Então, desde criança o judô moldou a minha personalidade. Moldou o meu caráter. Isso não tem preço. Porque o lado competitivo acaba um dia, mas o ser judoca eu vou ser pra sempre. Esse é o legado que o judô deixou pra minha vida.

O judô abre uma perspectiva financeira para quem queira viver só dele?

TIAGO CAMILO: O judô hoje está caminhando para um futuro muito promissor. Hoje temos atletas que são remunerados, lógico que são a minoria, mas os investimentos estão aumentando, os patrocinadores também, o que mostra que o judô é um esporte que traz resultado, é fácil de vender, quem sabe no futuro muitos atletas possam viver do judô, não a minoria, como hoje.

Os atletas top como você já ganham o equivalente a outros esportes, como tenista, por exemplo ou ainda não?

TIAGO CAMILO: Não dá pra comparar. Mas a gente vive no Brasil e sabe quantos por cento da nossa população é classe média alta. Na verdade não posso reclamar, sou uma pessoa privilegiada. Primeiro, por estar fazendo esporte, e depois pelo esporte ter me trazido muitas coisas, uma delas a estabilidade e a possibilidade de construir minha vida. Lógico que eu não vou ser milionário com o judô, mas certamente de tudo isso vão sobrar muitas coisas.