Instituto Baccarelli “exporta” talentos para a Europa

Por Graco Braz Peixoto


Maestro Roberto Tibiriçá regendo: Instituto é responsável pela formação de 500 alunos, entre 7 e 25 anos

Marcos Mota Araújo, 19 anos, violoncelista, e Edna Santos Ribeiro, 24 anos, violista, embarcaram no último fim de semana rumo à Europa. Nascidos em Heliópolis, foram integrar a Orquestra Juvenil Ibero-Americana, formada por músicos da América Latina, Espanha e Portugal, e promovida com o apoio dos governos de Portugal, Espanha e, em especial, da Venezuela, autora do projeto, por meio de seu maestro fundador, José António Abreu. Depois de um período de ensaios em Sevilha (Espanha), a Orquestra segue em turnê por Lisboa e Estoril (Portugal), e Madri (capital espanhola).

A condução é do maestro venezuelano Gustavo Dudamel, 28 anos, conhecido atualmente na Europa como a maior revelação no campo da regência, por interpretações marcadas por um estilo grandioso, comparável à força de Leonard Bernstein. Dudamel é também regente das orquestras Gothenburg Symphony (sueca) e Simón Bolívar (venezuelana), além de ter conduzido, em 2007, a Orquestra Filarmônica de Nova York e a orquestra de Los Angeles.

Para entender o processo que torna possível a ida de dois jovens para compor uma orquestra internacional de primeira linha, é preciso conhecer a trajetória de um certo maestro. Marcos e Edna foram acolhidos muito cedo pelo Instituto Baccarelli, escola criada pelo maestro Silvio Baccarelli em Heliópolis, fruto do caráter artístico e humanitário desse músico mineiro. Durante toda sua experiência pedagógica, Baccarelli, 78 anos, deu importância à música como instrumento de reflexão, de formação intelectual, e não apenas como simples aquisição de um campo profissional.

Nessa perspectiva, sempre acreditou que levar educação musical à população carente operaria uma mudança radical na vida dessas pessoas. Reforçando o dito popular de que “há males que vêm para o bem”, foi um incêndio ocorrido na favela, em 1996, que deu ao maestro o motivo para correr atrás de seu objetivo. Ao assistir na TV o desânimo e a tristeza dos moradores atingidos pela tragédia, dirigiu-se a uma escola pública da região onde algumas famílias estavam abrigadas e colocou-se à disposição das crianças para ensinar-lhes música, começando assim a cultivar uma afinidade com os instrumentos básicos de uma orquestra.

No início, ofereceu seu Auditório Baccarelli, em Vila Mariana, para acolher os futuros alunos. Poucos meses depois, com a inscrição de 36 garotos interessados, estava pronto o embrião do que viria a ser o Instituto Baccarelli. A Prefeitura teve participação na construção da escola com a cessão de um terreno à comunidade, onde atualmente se encontra a sua sede. Hoje, 13 anos depois, tornou-se um marco referencial do desenvolvimento cultural de Heliópolis. O Instituto é responsável pela formação de 500 alunos, na faixa de idade entre 7 e 25 anos.

Para chegar a esse estágio, a dedicação e o progresso da comunidade foram decisivos. O Instituto conta como o apoio da Lei Rouanet e de instituições mantenedoras da Sociedade de Concertos São Paulo / Instituto Baccarelli, além do aporte de recursos de ONGs com ações dirigidas a Heliópolis.

“Nossa função vai além do ensino musical. Cuidamos também da formação do caráter, e posso dizer que os garotos são muito responsáveis”, afirma o maestro Roberto Tibiriçá, professor e regente das orquestras do Instituto, sobre a repercussão da escola na vida dos alunos.

O Instituto Baccarelli possui atualmente quatro orquestras, com diferentes níveis de aprendizado, e mantém ainda o Coral da Gente. É formado por uma equipe executiva, com 21 profissionais, e pela equipe pedagógica, que tem como titular o maestro Tibiriçá e como maestro assistente, Edílson Ventureli. O corpo docente soma 25 professores de música, além de três maestrinas responsáveis pela regência do Coral da Gente.

O Instituto tem como patrono o maestro indiano Zubin Mehta, de fama internacional, que recentemente esteve em Heliópolis acompanhado de músicos da Orquestra Filarmônica de Israel para ministrar master classes - aulas de música avançadas e individuais - aos alunos. O interesse de Zubin Mehta pela experiência gerou um intercâmbio saudável com a fundação que administra a orquestra de Israel. Dois alunos de Heliópolis já ganharam bolsa de estudos para estudar naquele país. Agora, é a vez de Marcos e Edna cruzarem o Atlântico.