Ciclos d´água e suas relações

Em 18/06, Miriam Falótico realizou o curso de Águas Oceânicas e a Relação com as Águas Urbanas. Os ciclos d'água e suas relações foram o fio condutor da aula.

A gente olhou para o céu hoje? Vai chover? O minicurso de Águas Oceânicas e a Relação com as Águas Urbanas foi ministrado pela bióloga, pedagoga, doutora em Ciências e analista de meio ambiente, Miriam Falótico, no dia 18/06/2024.

Ela iniciou a aula questionando os participantes sobre o que os motivou a estarem presentes. As respostas revelaram uma variedade de interesses: desde curiosidade pelo assunto das águas oceânicas, da qualidade das águas e a interação delas com o meio urbano, até profunda paixão pela natureza ou pela beleza cênica das águas. Além disso, muitos vieram pelas áreas de graduação ou pós-graduação, em gestão pública, engenharia ambiental e outros cursos correlatos. Algumas participantes, como a biogeógrafa da Diretoria Regional de Educação São Miguel e uma profissional da Sabesp, destacaram a relevância direta do conteúdo para suas atividades profissionais, sublinhando a importância crescente da gestão sustentável dos recursos hídricos na cidade.

Com o intuito de instigar os participantes a "reaprenderem a olhar as águas", Miriam fez referência aos povos originários, apresentou diversas formas de nuvens e provocou: "A gente olhou para o céu hoje? Vai chover?". Em seguida, adentrou na parte técnica do curso pela fascinante Bacia Hidrográfica do Rio Amazonas. A sua área abrange impressionantes 7 milhões de km², com 25 mil km de vias navegáveis, atravessando o território de oito países. Recentemente, foi revelado que sua nascente está no Rio Mantaro, no Peru, percorrendo um longo caminho até desaguar no Oceano Atlântico, numa foz entre os estados do Amapá e Pará.

Miriam explicou detalhadamente a dinâmica e os cursos da água dentro de uma bacia hidrográfica, destacando a área de inundação e a interconexão da rede de rios. Ela descreveu como os rios se formam a partir da união de várias nascentes menores, que se unem para formar um curso d'água principal. Esse processo ilustra a interação entre diferentes fluxos de água na formação e no funcionamento dos sistemas hidrográficos.

Miriam lembrou, então, da história da grande enchente de 2017, das devastadoras enxurradas que ocorreram na cidade de São Paulo. Ela mencionou uma definição de nascente já muito enfatizada pela Subprefeitura da Vila Mariana, que possui muitos rios e nascentes “invisíveis” na região, destacando o caso da ação conjunta para revitalizar a nascente do Córrego do Sapateiro. Nascente seria, portanto, um local na superfície do terreno onde o nível freático do aquífero aflora. Compreender a relação entre as nascentes e o fluxo das águas urbanas também é muito importante para a gestão sustentável de áreas afetadas por eventos climáticos extremos.

O ciclo hidrológico, tanto em sua escala longa quanto curta, descreve o movimento contínuo de transformação da água na Terra. Em florestas, este processo vital envolve a evapotranspiração, onde cerca de 90% da água é transferida para a atmosfera na forma de vapor através das plantas e do solo. Os restantes 10% são evaporados diretamente das superfícies aquáticas. Essas massas de água em forma de vapor, comumente denominadas "rios voadores" (termo bastante controverso entre cientistas), viajam por longas distâncias antes de condensar e retornar à superfície como precipitação. Ou seja, a água pode percorrer grandes distâncias durante esse ciclo, movendo-se entre os reservatórios terrestres, atmosféricos e oceânicos, sustentando a vida.

Todos os dias 17 bilhões de toneladas de água saem dos rios e desaguam no oceano. Os rios voadores irrigam toda a região central e sudeste da América do Sul (regiões que concentram 50% do PIB do continente). Eles são como uma gigantesca usina hídrica de abastecimento. Por isso, o desmatamento afeta o ciclo da água sendo um problema grave que pede soluções urgentes. Miriam relembrou um evento marcante para os paulistanos: o "dia que virou noite", em 19 de agosto de 2019. Nesse dia, o céu de São Paulo escureceu em plena tarde e foi provado que as nuvens estavam carregadas de reteno, uma substância resultante da combustão incompleta de madeira e outros materiais orgânicos, oriunda das queimadas na Amazônia. “Esse fenômeno provou o fluxo das massas de ar, da Amazônia até aqui”, explicou Miriam, além de evidenciar a conexão entre o desmatamento e a qualidade das águas pluviais de São Paulo.

A aula seguiu então para uma discussão sobre a Bacia Hidrográfica do Alto Tietê, onde a Cidade de São Paulo está inserida, possui vários mananciais que abastecem a região metropolitana. A bacia é composta por várias sub-bacias, cada uma desempenhando um papel crucial no manejo das águas. Ela destacou a importância de compreender a dinâmica das sub-bacias para a gestão eficiente dos recursos hídricos e para a prevenção de desastres naturais.

Ao falar sobre a geologia do Município de São Paulo, explicou locais onde existem intensas ocupações com edificações e rede de avenidas, encontramos solos aluvionais, ou seja, que pertencem às áreas de inundação de rios e córregos espalhados pela cidade, “locais de baixada”, propícios para o avanço da água em dias de chuvas intensas. Pensando no futuro, Miriam levantou uma questão crucial: "Como vamos enfrentar os desafios que se apresentam nos próximos anos?". Ela ressaltou que é vital implementar medidas de proteção e restauração o quanto antes. Áreas de Preservação Permanente (APPs) mostram como a vegetação nativa que beirava as margens dos rios e córregos da cidade desempenhava um papel fundamental na contenção das águas durante enchentes e inundações (fenômenos naturais).

Assim, tendo em vista os sistemas de drenagem frequentemente inadequados na cidade, plantar e restaurar vegetações nessas áreas pode transformar a infraestrutura de drenagem urbana. São ações simples e eficazes que ajudam a absorver e retardar o fluxo da água da chuva, prevenindo desastres e perdas durante tempestades intensas.

Foi interessante compreender que esse problema se deu principalmente por causa da urbanização em áreas de várzea, completamente destruídas ao longo do tempo. O Tietê, por exemplo, possuía várias áreas de várzea, ou seja, terrenos alagáveis, muito férteis e de grande riqueza biológica, antes de ser retificado. Hoje em dia, existem propostas de recompor esses ambientes perdidos, para tentar recuperar pelo menos um pouco da diversidade de fauna e flora que já houve ali.

Ao final da aula, foi indicada a importância do documentário Entre Rios. Ele aborda a história de São Paulo, desde quando era São Paulo de Piratininga, com o Rio do Peixe Seco que virou o Rio Tamanduateí, até a expansão ferroviária, da metrópole e a criação do Vale do Anhangabaú. Dirigido por Caio Ferraz e lançado em 2009, o filme retrata a importância das águas dos rios para a cidade no passado, como para a navegação e extração de areia e argila das margens para as construções, bem como todo o histórico de retificações e canalizações que ocorreram nos cursos d’água ao longo do tempo.

O curso de Águas Oceânicas e a Relação com as Águas Urbanas, não apenas destacou a importância dos ciclos d'água e suas interconexões, mas também despertou nos participantes um novo olhar sobre a gestão e preservação dos recursos hídricos. Através de uma abordagem abrangente que mesclou aspectos técnicos, históricos e ambientais, Miriam conseguiu ilustrar a complexidade e a vitalidade das bacias hidrográficas, como a do Rio Amazonas e a do Alto Tietê, ressaltando a urgência de práticas sustentáveis diante dos desafios climáticos atuais.

 

Recorte da charge de Ziraldo.