Pessoas Surdocegas: direitos e as diversas formas de comunicação

“São poucos os que ainda saem para enfrentar esses movimentos, até por falta de conhecimento” diz Eulália Cordeiro sobre a pessoa com surdocegueira

 Segundo o Censo 2010, revisto em 2017, existem no Brasil mais de 6 milhões de pessoas com deficiência visual, só na cidade de São Paulo são 345 mil pessoas. Talvez você já tenha se deparado com esse termo antes em algum lugar, mas não saiba exatamente o que ele significa. Ou talvez você entenda, mas ainda tenha várias dúvidas sobre essa deficiência. Quando o assunto é pessoa com deficiência, o tema é amplo. Mas, vamos apresentar a surdocegueira.

É importante ressaltar que apesar de associar duas deficiências, a surdez e a cegueira, a surdocegueira não é uma junção das duas. Por afetar os dois canais que os seres humanos têm para a recepção de informações a distância, ela é considerada uma deficiência única, com suas próprias características e desafios. Com isso em mente, a palavra surdocegueira começou a ser usada nos anos 1990, ao invés da expressão “surdos e cegos”. É por isso também que o termo surdocego é escrito junto e sem hífen, para indicar uma deficiência distinta.

As conselheiras municipais do Conselho Municipal da cidade de São Paulo, Eulália Cordeiro e Cláudia Sofia, ambas com surdocegueira, que adquiriram devido à uma doença hereditária. Elas contam um pouco da deficiência e os desafios.

A Síndrome de Usher é caracterizada por perda auditiva e visual devido à retinose pigmentar. Ela é dividida em quatro tipos distintos, cada um com suas características específicas:
Usher Tipo I: Ocasiona surdez profunda, desde o nascimento, acompanhada de retinose pigmentar e cegueira noturna, muitas vezes resultando em perda de equilíbrio.
Usher Tipo II: Caracterizada por surdez leve a moderada, não progressiva, geralmente começando na puberdade, juntamente com retinose pigmentar. A cegueira noturna e a perda de equilíbrio são comuns na fase adulta.
Usher Tipo III: Neste tipo, há surdez neurossensorial congênita progressiva, onde existe perda da audição, gradualmente ao longo do tempo. Retinose pigmentar e cegueira noturna surgem na infância, acompanhadas de perda de equilíbrio.
Usher Tipo IV: Uma forma mais rara que afeta apenas cerca de 10% daqueles com a síndrome, mas cujas características específicas não foram fornecidas.


As formas de comunicação das pessoas surdocegas

As pessoas surdocegas usam línguas de sinais de seu país. A Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) é só no Brasil. O principal recurso de acessibilidade para a pessoa com surdocegueira é o “guia-intérprete”.

Tipos de Surdocegueira: Cegueira Congênita e Surdez Adquirida; Cegueira e Surdez Adquiridas; Surdez Congênita e Cegueira Adquirida; Baixa visão com Surdez Congênita ou Adquirida; Cegueira e Surdez Congênita.

Comunicação: Existem casos em que a pessoa adquire uma língua antes de se tornar surdocega; neste caso, dizemos que é um surdocego pós-linguístico. É o que ocorre se uma pessoa, por exemplo, nasceu surda e aprendeu a língua de sinais (LIBRAS, aqui no Brasil) como primeira língua. No caso de pessoas que fazem uso de Língua de Sinais e têm o campo da visão reduzido, o guia-intérprete fará os sinais em um determinado campo limitado onde este surdocego consiga visualizar.

Braille: É um recurso utilizado por pessoas com cegueira ou deficiência visual para desenvolver a escrita e a leitura pelo tato. Para tanto, são usados recursos materiais, como reglete, punção, máquinas Braille, soroban e, atualmente, a tecnologia da Linha Braille.

Alfabeto Dactilológico: É o uso do alfabeto manual utilizado pelos surdos. O interlocutor faz a letra na palma da mão da pessoa surdocega.

Tablitas de comunicação: É um meio de comunicação feito de plástico resistente com letras em relevo, números ordinários e caracteres em braille. A pessoa com surdocegueira coloca o dedo indicador nas letras, assim estabelecendo a comunicação.

CCTV: É um ampliador de imagens que visa auxiliar, na leitura e na escrita, uma pessoa que tem um resíduo visual muito pobre. O CCTV amplia em até sessenta vezes o tamanho da figura.

Teletouch: Este aparelho tem um teclado de uma máquina braille e um teclado normal. Tanto o teclado Braille como o teclado normal levantam, na parte de trás do aparelho, uma pequena chapa de metal, a cela braille, contendo uma letra de cada vez. Ao interlocutor do surdocego, basta saber ler. Este interlocutor, então, pressiona as teclas normais da teletouch como se estivesse redigindo um texto escrito qualquer.

Escrita em letras de forma: Neste caso, é preciso que o interlocutor conheça as letras maiúsculas do alfabeto. O dedo indicador funciona como uma caneta, e o interlocutor escreve na palma da mão do surdocego.

Tadoma: A pessoa surdocega deve ter conhecimento da língua oral. Ele coloca uma das mãos na face do interlocutor, próximo à boca, para então fazer a “leitura” da articulação das palavras e sentir também a vibração dos sons. É preciso muito treino e prática da pessoa surdocega para estabelecer comunicação utilizando este método. Ele também é chamado como "leitura labial tátil", na qual a pessoa surdocega sente o movimento dos lábios, bem como as vibrações das cordas vocais, o movimento das bochechas e o ar quente expelido pelo nariz para a produção de sons nasais ? como 'N' e 'M'. Foi criado pela professora norte-americana Sophia Alcorn.

Pessoas surdocegas fazem uso de algumas formas de comunicação para poder interagir com outras pessoas, as duas mais comuns são: Tadoma e a Libras Tátil. Cláudia Sofia tem síndrome de Usher tipo III, ela perdeu sua audição ainda na infância, quando tinha 6 anos e aos 9 anos, foi quando teve o diagnóstico de retinose pigmentar, se tornando surdocega aos 19 anos de idade.
"O método de comunicação é a Tadoma porque eu tenho uma boa memória de leitura labial, e isso me ajuda bastante. Mas também sei a Língua Brasileira de Sinais (Libras) para eu estar me comunicando com outras pessoas, principalmente com o meu esposo, que já nasceu surdo, foi oralizado e utiliza da Libras tátil".

Alfabetização e o estudo

"Fui alfabetizada, desde os meus 3 anos de vida e sempre fui considerada uma criança ouvinte, até os meus 6 anos de idade, que foi quando eu perdi minha audição. Não sabíamos que era uma síndrome genética, viemos saber só no futuro, quando eu e minha família decidimos fazer um estudo genético".

"Eu tive muitas dificuldades na sala de aula para acompanhar os professores em sua disciplinas, porque mesmo usando aparelho auditivo, os professores esqueciam que eu era uma criança surda e minha família não considerava uma criança surda, porque como eu usava aparelho auditivo eu ouvia, mas eu, na minha concepção sei que era uma criança surda." Claudia ainda ressalta que conseguiu terminar o ensino fundamental graças ao apoio da família e amigos, mas não terminou o médio por se tornar surdocega total aos 19 anos.
De maneira diferente e ao mesmo tempo semelhante, Eulália Cordeiro, nos contou que não teve problemas com a alfabetização, mas devido a surdocegueira não conseguiu concluir o ensino médio.

O dia da pessoa surdocega

Eulália tem síndrome de Usher tipo II, retinose pigmentar e cegueira noturna. Ela é Conselheira no CMPD e Conselheira Fiscal no Grupo Brasil de Apoio ao Surdocego e ao Múltiplo Deficiente Sensorial desde 2006, ela reforça a importância da luta de uma pessoa surdocega e que é importante trabalhar para melhorar a qualidade de vida das pessoas com deficiência.

"Eu moro aqui em São Paulo, atualmente trabalho nesses movimentos entre conselhos, conferências… sempre procurando melhorar a qualidade de vida das pessoas com deficiência e enfatizando nas pessoas com surdocegueira que ainda tem muita invisibilidade, são poucos que ainda saem para enfrentar esses movimentos até por falta de conhecimento. Eu, a Cláudia Sofia, o Carlos Jorge, esposo dela e a Camila Indalecio, procuramos levar essas informações tanto para familiares, escolas, quanto para a necessidade de trabalhar as políticas públicas para as pessoas com surdocegueira."

EMEBS Helen Keller e Atende+

A Escola Municipal de Educação Bilíngue para Surdos Helen Keller foi pioneira na educação de surdos e surdocegos dentro da educação pública de São Paulo. Ela funciona desde 1952. O atendimento aos alunos é realizado com base na Pedagogia Visual, que faz uso de materiais visuais, da língua de sinais, da imagem, do letramento visual ou leitura visual.

Segundo a Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos (Feneis), a EMEBS Helen Keller é a primeira escola pública bilíngue para surdos a oferecer todas as etapas e modalidade da educação básica, ou seja: Educação Infantil, Ensino Fundamental, Ensino Médio e EJA.

A Prefeitura Municipal de São Paulo oferece escolas bilíngues e escolas-polo com atendimento especializado. As unidades educacionais contam com professores surdos que atuam como modelos linguísticos, intérpretes de Libras e guias-intérpretes, proporcionando acessibilidade linguística aos alunos. A Escola Municipal de Educação Bilíngue para Surdos Helen Keller foi pioneira na educação de surdos e surdocegos dentro da educação pública de São Paulo. Informações sobre o programa.

Outro serviço também para pessoas com surdocegueira é o Atende+. Modalidade de transporte gratuito. Saiba mais: www.sptrans.com.br/atende/.