Dona de casa alagoana alimenta, com seu leite, 265 bebês do Hospital Municipal do Campo Limpo

Doadora do Banco de Leite ajudou a salvar a vida de centenas de bebês

Por José Antonio Leite e Cassia Juliana F. Tamborino

Ivaneide Maria dos Santos Lima é uma mulher determinada. Espelhando-se na mãe, que dividia o trabalho com a criação e a amamentação dos filhos, saiu de sua terra para ganhar a vida em São Paulo. Na capital paulista trabalhou como auxiliar de escritório e se casou. Teve três filhos. Amamentou a todos. Com o leite que sobrava, tornou-se a maior doadora do Hospital Municipal Dr. Fernando Mauro Pires da Rocha (HMCL), em Campo Limpo. Nos últimos dois anos, abasteceu o banco de leite com nada menos de 344 litros. Pelo menos 265 bebês foram beneficiados. “Não há motivo para desperdiçar quando milhares de bebês necessitam de leite materno”, afirma.

O exemplo de solidariedade fez com que a direção do HMCL a escolhesse para ser homenageada no o 1º Encontro de Nutrizes e Receptores de Leite Humano, que ocorreu no dia 15 de agosto no hospital. Na ocasião, emocionada, Ivaneide reencontrou algumas mães e crianças que se beneficiaram de seu ato de amor. (leia abaixo).

A Organização Mundial da Saúde (OMS), o Ministério da Saúde (MS) e a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) recomendam a amamentação exclusiva por seis meses. Dar leite materno às crianças é um dos fatores que contribuem para a redução da mortalidade infantil.

Moradora do M’ Boi Mirim, Ivaneide, de 42 anos, veio para São Paulo em 1992. Cinco anos depois, casou-se. Em 2001 nasceu João Victor, seu primeiro filho. Artur veio em 2008. Há dois anos nasceu Valentina, a caçula. “Os três mamaram bem. Com a Valentina, que mama até hoje, foi impressionante. Depois de dar o peito a ela, o leite continuava jorrando. Tinha de ir ao banheiro e jogar fora o que sobrava. Foi então que, lendo um anúncio sobre aleitamento materno, procurei um local para fazer doação. Me recomendaram o HMCL”.

Pelo menos três vezes por semana funcionárias do hospital passaram a visitar a casa de Ivaneide para coletar o leite, que segundo a própria mãe era “tirado na mão”. “Nunca precisei de maquininha. Tiro o leite com as mãos, apertando os seios. Nunca senti dor, apenas prazer em estar ajudando outras crianças a ter saúde, assim como fiz com os meus. Não pretendo ter mais filhos, mas se tivesse continuaria doando”, afirma.

Franca nos atos e nas palavras, Ivaneide – filha mais velha entre dez irmãos - diz saber exatamente de onde veio a lição de solidariedade que hoje repassa a todas as mães cujos filhos se alimentaram de seu leite. “Minha mãe, de 60 anos, e meu pai, de 73, que ainda moram em Porto Calvo (litoral alagoano), nos habituaram a mamar no peito. Também no caso de mamãe, o leite sobrava. Meu pai dizia que a fartura era dádiva de Deus, e que devia ser repartida com todos que precisassem”, relembra.
                                                                                                      (foto: Edson Hatakeyama)


Ivaneide (à esquerda com Valentina) e uma mãe cujo filho se beneficiou de seu leite 

 


Hospital do Campo Limpo realiza encontro para valorizar doadoras de leite

                                                                                                 (foto: Edson Hatakeyama)


Grupo de mães que receberam doação de leite se reúne para homenagem 

O Hospital Municipal Dr Fernando Mauro Pires da Rocha (HMCL) realizou no último dia 15 o 1º Encontro de Nutrizes e Receptores de Leite Humano. O evento integrou as comemorações organizadas pelo Ministério da Saúde dentro do projeto “Agosto Dourado” - a amamentação vale ouro, que incentiva e apoia o aleitamento materno.

Atendendo uma população aproximada de 216 mil pessoas, o hospital realiza em média 360 partos por mês. Este número é suficiente para gerar grande demanda de pacientes prematuros de baixo peso, que não sugam leite suficiente e que necessitam receber leite humano pasteurizado e processado pelo BL.

O evento aconteceu no anfiteatro do hospital e contou com a presença da equipe multidisciplinar do banco de leite do hospital, formada por médica, enfermeira , nutricionista e técnico de enfermagem lactarista.

“O banco de leite humano é uma parte do hospital onde a gente promove a amamentação. Isso é muito importante para os nossos bebes que estão internados, que são prematuros e cujas mães não têm condições de amamentar. O próprio bebê não tem condição de tirar o leite da mãe”, disse a nutricionista Alexandra Paes de Andrade, coordenadora do Banco de Leite do hospital e organizadora do evento.

Alexandra também explicou que a maioria das pessoas que doa o leite materno mora na região, mas que o hospital também recolhe o leite das mães para seus próprios filhos quando isso é possível. “O leite humano é próprio para o bebê, sem nenhuma interferência, é absorvido totalmente. Ele tem a parte de anticorpos que são muito importantes para as crianças. No caso de doadores externas, a gente tem esse excedente na doação que vai para esses bebes internados na UTI Neonatal”, explicou.

Ivaneide, a grande homenageada, se mostrou emocionada ao falar de seu gesto. “Eu estou muito feliz com a homenagem. Não esperava poder alimentar tantas crianças. Não era apenas leite. Eu estava doando saúde, doando vida. Fiz a diferença. A gente vive num mundo tão desigual”, afirmou a doadora.