Alcione conta como o SUS foi importante para a construção da consciência social que tem hoje

Acolher os pacientes é a grande motivação da fonoaudióloga, que atua na Unidade de Referência à Saúde do Idoso Sé

O fonoaudiólogo é um especialista que atua com os mais diferentes aspectos da comunicação humana, desde linguagem oral e escrita, fala, voz, audição, até as funções responsáveis pela deglutição, sucção, respiração e mastigação. Alcione Ramos Campiotto, 57, soube da existência da profissão quando ainda não era reconhecida no Brasil. Um ano depois, quando isso aconteceu, ela então concluiu o bacharelado na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), onde se formou em 1982. Durante 26 anos, trabalhou em consultórios e hospitais particulares, mas, em 2008, com os filhos Helena e Heitor crescidos e as responsabilidades diminuindo em casa, Alcione resolveu que era a hora de encarar novos desafios profissionais.

Assim que entrou na prefeitura, foi trabalhar em Perus, bairro periférico da zona norte da cidade, e lá que descobriu o “poder” do Sistema Único de Saúde (SUS). “Quando passei no concurso, comecei a trabalhar no Núcleo Integrado de Reabilitação (NIR), foi um choque de realidade, compreendi a importância do atendimento e da assistência à saúde de forma igualitária, para todos. Eu não teria a consciência social que tenho hoje, se eu não trabalhasse no SUS”, afirma.

Foto de uma mulher. Ela está vestida com um jaleco branco, com uma blusa verde por baixo e usando um colar preto na altura do peito. A profissional usa máscara de proteção azul e óculos de armação marrom.

A profissional diz que foi a entrada no SUS que a ajudou na construção da consciência social que tem hoje (Foto: Arquivo Pessoal)

Como entrou no serviço público aos 43 anos de idade, com mais bagagem, não demorou para Alcione ser convidada a assumir funções gerenciais. Saiu da assistência para ser interlocutora na Coordenadoria Regional de Saúde (CRS) Centro. Esse trabalho, segundo ela, a fez enxergar de maneira mais ampla a construção das políticas públicas de saúde, a orientação da “ponta” (de serviços e equipes de saúde nas regiões da cidade), o cuidado com metas e programas de gestão, o que segundo a fonoaudióloga é muito diferente do atendimento de pacientes no dia a dia. Em agosto de 2021, ela sentiu a falta do que a fazia feliz antes e pediu para voltar à assistência. “É muito bom trabalhar ajudando a criar e gerenciar projetos, mas nada se compara com o contato humano, a relação com os pacientes é a grande compensação de tudo”, opina.

Acolher e ajudar os pacientes a solucionar suas questões de saúde continuam sendo a grande motivação da profissional, que atualmente atende na Unidade de Referência à Saúde do Idoso (Ursi) Sé, na região central, e explica que tão importante quanto o trabalho técnico é a escuta qualificada. “Eu fiz o acolhimento de um senhor, o Romeu. É muito gostoso, a pessoa conta a história da vida, traz o seu sofrimento, o porquê de estar aqui, o seu desejo quando busca o serviço de saúde, o que está impactando na vida dela, na saúde. Nessas horas é muito importante prestar atenção aos detalhes, ao que o paciente precisa.”

A recompensa é, segundo ela, marcar positivamente a vida das pessoas, como a de uma mãe que sete anos depois de Alcione prestar atendimento à sua filha, procurou por ela em uma rede social, apenas para saber como a fonoaudióloga estava. “Eu atendi uma criança que tinha uma deficiência intelectual neurológica importante, ela tinha dificuldade de comunicação, desenvolveu apenas alguns vocábulos, então não conseguia se comunicar exclusivamente pela fala, em Perus, há mais de sete anos. E, há alguns meses, recebi uma notificação no Facebook de uma pessoa que queria me adicionar e eu olhei o nome, achei que conhecia, quando vi a carinha, falei: “nossa, eu conheço essa moça.” E ela me mandou uma mensagem no Messenger: “oi, você lembra de mim? Sou a mãe da fulana.” E eu pensei assim: ela deve estar precisando de alguma coisa. O que será que ela está precisando, algum tipo de ajuda? E aí eu falei: “oi, como você está? Tudo bem? Há quanto tempo, me fala o que você precisa?”. E a mãe respondeu: “não, não preciso de nada. Só queria saber como você está, porque eu estou com saudade de você.” Aí, tivemos uma conversa de algumas mensagens trocadas, mas aqueceu o coração bastante, a gente não tem ideia de o quanto tocamos as pessoas.