Secretaria Municipal de Cultura e Economia Criativa

Maio celebra toda a força das imagens

Fonte: O Estado de S. Paulo
Começa oficialmente hoje a tradicional programação da cidade apoiada em fotos

Simonetta Persichetti

O fotógrafo francês Raymond Depardon é o grande destaque deste 8º Mês Internacional da Fotografia em São Paulo, que começa oficialmente hoje na Caixa Cultural da Praça da Sé. Da linha dos fotógrafos humanistas, Depardon procurou traçar um documento das pessoas, dos locais e da cultura. Suas fotografias refletem a busca de uma interpretação poética dos locais pelos quais passou (veja na página seguinte).

Nesta exposição que chega ao Brasil pelas mãos da Embaixada da França, da Aliança Francesa e da própria Caixa, Depardon, atualmente com 64 anos, enviou 37 fotografias da Fazenda do Garet (La Ferme du Garet), local onde passou sua infância. É lá numa volta ao passado, como se relesse um antigo diário, que ele traça um panorama do cotidiano da região e ainda dos camponeses que ainda vivem no local. Uma homenagem a um lugar que hoje só é memória na vida do fotógrafo.

Muitas outras exposições também participam deste evento que já se tornou tradição, inscrevendo São Paulo no circuito dos festivais da fotografia- a cada dois anos no mês de maio.

Ainda na Caixa, poderão ser vistas 30 imagens que fazem parte do acervo da Farm Security Administration, um empreendimento realizado pelo governo norte-americano entre 1935 e 1942 em conseqüência da Depressão após a quebra da Bolsa de Nova York em 1929. Roy Stryker, que dirigia o departamento, teve a idéia de realizar por meio da fotografia um grande levantamento da situação do interior do país. Para isso, reuniu um time de fotógrafos já conhecidos, como Dorothea Lange, Walter Evans, Ben Shahn, Russell Lee, Carl Mydans, Jack Delano, entre outros. Com olhar sociológico e documentário inspirado nos trabalhos de outro fotógrafo americano, Lewis Hine, o grupo fez um grande levantamento das regiões rurais do país. A estética ‘criada’ por esse grupo para realizar o trabalho acabou se tornando referência para a fotografia documentária no mundo todo.

Além das internacionais, a Caixa Cultural traz também dois destaques brasileiros, a mostra de Carlos Moreira, Eu Olhei tanto, uma coletânea de imagens feitas ao longo de quase 40 anos em Santos e no Guarujá. A outra é o trabalho do jornalista e fotógrafo Fernando Costa Netto, que registrou no início dos anos 90 o esfacelamento da antiga Iugoslávia. Fernando registrou parte da guerra que vitimou mais de 250 mil pessoas. Doze anos depois, ele retornou aos mesmos lugares para registrar a reconstrução do país. São esses dois momentos que poderão ser vistos na mostra.

O curioso é que todos esses trabalhos se voltam para o documental, uma expressão fotográfica já criticada por teóricos da imagem que repudiam o caráter testemunhal da fotografia nos dias de hoje, onde a imagem digital nos ensina que a fotografia antes de mais nada pertence ao mundo da ficção. Cada vez mais, fica clara a construção deliberada das imagens e reencontramos um olhar mais ‘purista’ da fotografia.

Na Pinacoteca, por exemplo, o destaque fica por conta das imagens realizadas pelo fotógrafo peruano Martin Chambi e seus descendentes, também fotógrafos e de alguma maneira herdeiros de seus olhar: são fotografias de sua filha Julia, seu neto Teo Allain e seu bisneto André Fernando Chambi.

No Centro Cultural São Paulo, a festa é dupla: além do Mês Internacional da Fotografia, comemoram-se os 25 anos da instituição. A idéia foi convidar um grupo para registrar o espaço. Participam: Caio Reisewitz, German Lorca, João Musa, Nair Benedicto, Nelson Kon, Rubens Mano, Rochelli Costi, Ding Musa, Luis Telles, Marco Butti, Mauro Restiffe e Pedro Perez.

Outro destaque é a exposição e o lançamento do livro Fotografia na Bahia. 1839-2006, que poderá ser vista no Museu Afro-Brasil. O projeto coordenado pelo fotógrafo Aristides Alves mapeia a produção de fotógrafos e imagens feitas na Bahia desde os seus primórdios, por nomes como Mullock, Gaensly, Lindemann, Pierre Verger, além de fotojornalistas, e fotógrafos de moda e publicidade. A pesquisa ficou por conta de Maria Guimarães Sampaio e Célia Aguiar para o período que vai de 1839 a 1949 e por Rubens Fernandes Junior e Gustavo Falcon o período de 1950 a 2006.

Mas as exposições não se restringem aos espaços culturais ou museus e se alastram pela cidade. Aliás, é a própria cidade que acabou se organizando e colocando em seu calendário mostras fotográficas no mês de maio. Sem uma coordenação mais influente - os meses da fotografia sempre tiveram a organização do Nafoto - acabamos por encontrar na cidade um retalho de olhares e visões fotográficas. Se por um lado isso é muito interessante, pois nos permite uma diversidade de estéticas e um olhar mais aberto sobre o fazer fotográfico na atualidade, por outro falta um eixo curatorial e um debate mais acurado em torno da produção contemporânea. Reflexão necessária quando sabemos que a fotografia se consolida cada vez mais no mundo artístico e, nas outras áreas, procura uma ressignificação e um sentido para sua funcionalidade. O importante é que a fotografia está aí, à vista de todos.