Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania
Programa “Ruas de Memória” pretende mudar nomes de vias que homenageiam símbolos do regime militar mobilizando a população
Promover a alteração dos nomes de ruas, pontes, viadutos, praças e demais logradouros públicos que homenageiam pessoas vinculadas à repressão do regime militar e ressignificá-los com o nome daqueles que lutaram pela democracia, liberdade e direitos humanos. É este o objetivo do programa "Ruas de Memória", lançado na manhã desta quinta-feira, 13/08, pela Prefeitura de São Paulo. Na ocasião, também foram assinados dois projetos de lei que serão enviados à Câmara Municipal. Um propõe a proibição de novas nomeações que homenageiem responsáveis por violações aos direitos humanos, e o outro apresenta a alteração do nome do Viaduto 31 de Março, localizado no distrito da Sé, para Viaduto Therezinha Zerbini, referência na luta das mulheres pela anistia durante o período da ditadura militar. O dia 31 de Março é reivindicado pelos apoiadores do golpe de 1964 como a data da instalação do regime militar no país.
"Esse projeto visa celebrar a vida daqueles que se dedicaram à democracia e que lutaram pelas liberdades individuais no nosso país, substituindo o nome daquelas ruas associadas ao período de arbítrio, ao período da violência que reinou no nosso país durante mais de 20 anos. É um resgate importante, uma reafirmação do compromisso de São Paulo com os valores democráticos. E tudo isso será feito em comum acordo com a comunidade", destacou o prefeito Fernando Haddad.
Conforme detalhado pela Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHS), o programa parte da compreensão de que, para além das graves violações a indivíduos e a coletivos, a ditadura militar interferiu opressivamente no espaço público, na tentativa de conter possíveis focos de resistência, proibindo reuniões e manifestações políticas. Coibiu assim o direito à utilização destes espaços, transformando a cidade num simples entreposto entre a casa e o trabalho.
Segundo o levantamento realizado pela Coordenação de Direito à Memória e à Verdade (DMV) da Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC), existem na cidade de São Paulo 38 logradouros associados à ditadura, dos quais 22 homenageiam ditadores, torturadores ou chefes dos serviços de segurança que serviram à repressão. Por meio do “Ruas de Memória”, moradores de vias que carregam esses nomes poderão se mobilizar pela alteração, com apoio da SMDHC. Os novos nomes serão definidos com a participação de membros da comunidade local, fomentando o diálogo sobre a violência de Estado e os impactos do legado autoritário nos dias atuais.
"Nós estamos fazendo mais do que uma reparação simbólica das vítimas da ditadura. Estamos fazendo uma dupla reparação, porque a proposta enseja também a concepção democrática, não só pelo trâmite das propostas do Legislativo municipal, mas porque envolve as comunidades na discussão da definição das novas denominações que devem ser feitas", afirmou o ministro-chefe da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, Pepe Vargas.
A primeira mobilização desse tipo ocorreu de forma experimental, em maio deste ano, na rua Golbery do Couto e Silva, no Grajaú, com intervenções artísticas de coletivos e saraus da zona sul. A ação resultou em um projeto de lei participativo, atualmente em tramitação na Câmara, que propõe a substituição do nome do general, que foi chefe do Serviço Nacional de Informações (SNI) durante a ditadura, pelo do padre Giuseppe Pegoraro, sugestão acolhida pelos moradores em reconhecimento às contribuições prestadas pelo religioso ao bairro. A orientação do programa é de que sejam homenageadas pessoas de referência na área de direitos humanos e que tenham relevância para as populações dos territórios.
Outras duas mobilizações estão previstas para 2015. Uma na rua Doutor Alcides Cintra Bueno Filho, localizada na Vila Amália, zona norte; outra na rua Senador Filinto Muller, no Parque São Rafael, zona leste. O objetivo da Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania é que, em parceria com a Secretaria Municipal de Serviços, o programa também leve para essas ruas melhorias como nova iluminação, podas de árvores, limpeza urbana e até pontos de sinal de internet grátis, por meio do programa WiFi Livre SP. A ideia do trabalho conjunto é ressignificar esses locais.
"Esta é uma entrega para além das vítimas diretas do Estado durante a ditadura militar, mas também para toda a cidade, que de uma forma ou de outra também sofreu com a repressão e até hoje vê as marcas desse legado autoritário espalhadas pelas ruas da cidade. O programa Ruas de Memória é uma maneira de a gestão dizer que não tolera nome de torturadores estampados nas ruas da cidade", afirmou Carla Borges, Coordenadora de Políticas de Direito à Memória e à Verdade. “Nós precisamos fazer todas as ações para avançar no sentido de sempre garantir a democracia. Não podemos permitir que a nossa democracia seja quebrada por quem não queira respeitá-la", completou Eduardo Suplicy, secretário municipal de Direitos Humanos.
O programa “Ruas de Memória” segue a linha de recomendações do Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3) e a recomendação 29 do Relatório Final da Comissão Nacional da Verdade (CNV), publicado em 2014. O programa parte da compreensão de que, além das graves violações a direitos individuais e coletivos, a ditadura militar também interferiu opressivamente no espaço público, a fim de conter possíveis focos de resistência, proibindo reuniões e manifestações políticas. Na mesma linha, logradouros e equipamentos públicos foram nomeados em homenagem a agentes oficiais e civis que apoiaram a política autoritária e que cometeram crimes de lesa-humanidade, enaltecendo símbolos da repressão e fomentando valores antidemocráticos como referências às novas gerações que circulam diariamente na cidade.
Por que homenagear Therezinha Zerbini
Therezinha de Godoy Zerbini nasceu em São Paulo, no dia 16 de abril de 1928. Foi ativista de direitos humanos, fundadora e líder do Movimento Feminino pela Anistia (MFPA), criado em 1975 e que é considerado um dos marcos da luta pela redemocratização e pela promulgação da Lei da Anistia. Therezinha foi casada com o general Euryale de Jesus Zerbini, um dos poucos generais a assumir posição legalista, contrária ao golpe de 1964. Ele teve os direitos políticos cassados e foi reformado do Exército por causa de sua decisão. Therezinha foi indiciada em dezembro de 1969, após conseguir um sítio de um amigo em Ibiúna (SP) para a realização de um congresso da União Nacional dos Estudantes (UNE). Enquadrada na Lei de Segurança Nacional, foi presa em fevereiro de 1970 e ficou detida por oito meses – seis deles no presídio Tiradentes, na capital paulista. Após o regime militar, Therezinha ajudou na refundação do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) e, depois, a fundar o Partido Democrático Trabalhista (PDT), ao lado de Leonel Brizola. Ela morreu em 14 de março deste ano, aos 87 anos. Em maio do ano passado, a ativista foi homenageada pela Prefeitura ainda em vida.
A Secretária da SMPM, Denise Dau, prestigiou o lançamento do Programa Ruas da Memória e reforçou a disposição da SMPM em contribuir com o Programa, ao resgatar a história de luta de várias mulheres como base para o trabalho de substituição aos nomes que homenageiam pessoas vinculadas à repressão do regime militar. Para Denise Dau, “esse resgate histórico dará oportunidade para que mulheres e homens que, de fato, têm relação de luta, de atuação pela democracia, nos bairros e regiões da cidade sejam as verdadeiras/verdadeiros homenageados”.
Compuseram a mesa de apresentação do Projeto Ruas da Memória o prefeito Fernando Haddad, a vice-prefeita, Nádia Campeão, o ministro-chefe da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, Pepe Vargas, o Secretário e Secretário Adjunto de Direitos Humanos e Cidadania, Eduardo Suplicy e Rogério Sottili, o presidente da Câmara Municipal de São Paulo, vereador Antonio Donato, a vereadora Juliana Cardoso e a Coordenadora de Políticas de Direito à Memória e à Verdade, Carla Borges.
*Com informações de SECOM
*Fotos: Natália Natarelli / SMDHC
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